Poéticas
Curadoria: Samuel Graças
Período: 8/5/21 a 21/5/21
Local: Galeria 3d interativa
Alcance: Visitantes de 14 países em 266 cidades
Artistas: Arthur Ulhôa, Daniela Versiani, Delicia Bascuñán, Fabiano Gonçalves, Gabriel Bertozzi, Messias,
Nelson Edi Hohmann, Wallisson Arthur
Texto curatorial
Em 1936, Walter Benjamin propôs em “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” o conceito da aura que reveste o artista e que a partir dele é emanada à obra. Essa noção foi amplamente absorvida pela academia mundial, tendo tornado-se essencial para a compreensão da obra de arte enquanto objeto que existe para além de sua constituição física.
Esse poder, seja ele inerente ou não a quem o detém, de encantar coisas advindas do dia-a-dia é o que permite a um artista inserir em sua produção pensamentos, sentimentos, conceitos, memórias e discursos. Enfim, todos os elementos de sua pesquisa.
Essa retórica apóia a teoria da reciclagem na qual se baseia Fabiano Gonçalves, um artista que transforma estruturas fadadas ao descarte em suporte para sua pintura. Já a chilena Delicia Bascuñán faz uma releitura de técnicas e elementos ligados à indumentária para gerar uma reflexão sobre a beleza feminina.
No campo das reinterpretações também está Daniela Versiani, artista e escritora que investiga a própria caligrafia enquanto experiencia estética. Daniela utiliza o traço da palavra como ponte entre a escrita e as artes visuais, ao passo que Arthur Ulhôa o tem como elemento básico de suas composições cartunescas onde o inesperado sempre aparece para salvar o dia.
Os ideais presentes nos desenhos de Arthur encontram ressonância nos objetos escultóricos de Messias, visto que os dois artistas propõem críticas à sociedade brasileira enquanto entidade racista, classista e militarizada.
Messias elabora um discurso visual com alusões à sua militância pelas causas afro e indígena. Seu trabalho atinge uma dimensão metafísica ao apresentar o orixá Xangô como contraponto às injustiças sociais. Gabriel Bertozzi também faz um paralelo entre sua desaprovação ao sistema vigente e à divindade. Contudo, a deidade presente em seu universo pictórico opera a partir do egoísmo. Gabriel, com tela e tinta, se opõe a um ente que parece ser onipotente, onipresente e onisciente: o deus mercado financeiro.
Uma interessante análise entre a motivação do artista e a ocupação do espaço surge quando os trabalhos de Gabriel Bertozzi, Wallisson Arthur e NEEHO são considerados conjuntamente. Gabriel pinta centrando-se em uma realidade externa com desdobramentos coletivos; Wallisson cria na direção oposta, ele produz pinturas em uma tentativa de compreender os signos de seu subconsciente; já a razão motivadora de NEEHO não está em outro lugar que não seja no próprio espaço, seu anseio é ocupá-lo com forma e cor.
Uma tela na qual respingou tinta não é uma obra de arte, para que esse título possa ser-lhe concedido ela precisa estar imbuída pelas intenções do artista. Nesse processo de transmissão do intento, o criador confere à criação parte de sua forma de estar no mundo; a obra passa a existir em um complexo sistema sociocultural de maneira orientada pela origem geográfica de seu idealizador e pelo tempo em que ele vive.
As reflexões acerca da condição humana suscitadas por cada obra serão diferentes para cada pessoa, pois todo visitante fará sua leitura através da lente de seu efervescente mundo particular.
Ainda mais diversa é a possibilidade de entendimento geral da mostra, na medida que o que é estimulado por um trabalho se complementa pelas experiências propiciadas pelo seguinte. Os mapas e caminhos de compreensão estão abertos, e neste exato momento você está sendo convidado a criar os seus.
Samuel Graças